A origem da dinastia agilofing na Antiguidade (ensaio)
INTRODUÇÃO
A dinastia européia dos agilofings havia sido observada por nós
em ligação com a genealogia dos condes de Hesbaye no século VII d.C - estes
de origem franco-borgonhesa, wido ou guido (1).
Porém, na continuação de nossos estudos encontramos
sugestões sobre uma origem bem mais antiga da dinastia agilofing ligada aos “agilofs”
godos nos séculos IV - V d. C, antes
de Cristo mesmo associada aos povos getae e dácios.
Numa vila chamada Agighiol, no condado de Tulcea (na Romênia), hoje reserva
geológica, recentemente soubemos que foi encontrado um belíssimo elmo geto-dácio do sec. V a. C. denominado “Elmo de Agighiol”.
O Elmo de Agighiol acima é um capacete de
prata geto-dácio que, datando do século V a.C., ainda hoje se encontra no
Museu Nacional de História Romena, Bucareste - capacete semelhante ao de
Cotofenesti e três outros capacetes de ouro ou prata também getos
descobertos até agora.
Elmo de Cotofenesti
Capacete de ouro geto-daciano, também hoje no
Museu Nacional de História da Romênia - “Gold helmet from Poiana Cotofenesti
(now called Poiana Vărbilău), Prahova County, Romania”
Em busca de outras informações, soubemos
por fontes locais da cidade da Tulcea,
baseadas no historiador grego Diodoro,
que o núcleo desta cidade no
século VIII antes de Cristo fora fundado sob o nome de um Egisso (Aegyssos ou Aegyssus)
Ovídio em sua obra ‘’Ex Ponto’’ também informa que o antigo nome da cidade seria o de
seu fundador - um dácio chamado Cárpio
Egisso (ou Carpyus Aegyssus).
Os povos dácios são mencionados no reinado de
Augusto, que os obrigou a reconhecer a supremacia romana. O reino dácio sobreviveu de 168 a.C. até a
conquista romana em 106 d.C. No século I, a cidade de Egisso
foi conquistada pelos romanos e estes
estabeleceram aí uma base para sua frota com muralhas e torres de grandes dimensões
- ruínas ainda hoje são visíveis.
Assim
sendo, neste atual ensaio somos levados a sugerir que a dinastia dos agilofings desenvolveu-se a partir de uma
dinastia ligada aos dácios na antiguidade, por líderes getas e posteriormente godos. E
já na era cristã, no sec.
III d.C., membros de prestígio da família com a denominação de AEgidius (Aegyssus)/Siagrii teriam até mesmo penetrado
por casamento as cortes romanas. Nosso artigo sobre a genealogia do
conhecido general AEgidius Siagrii (c.390
– c. 465) confirma este fato (2).
DESENVOLVIMENTO
Lembramos
que a teoria construída pelo historiador Jordanes (godo do século VI
d.C.) baseava-se na idéia de que os godos da alta Idade Média eram o mesmo povo gauta originário do sul da Escandinávia na era do bronze, e ainda os
getas na antiguidade localizados nas
margens do Mar Negro. Getas ou
getae (em grego: Γέται, singular Γέτης) - nome dado pelos gregos às tribos dácias ou trácias que
ocuparam na antiguidade as regiões ao sul do Baixo Danúbio, região atual norte
da Bulgária, e ao norte do Baixo Danúbio, a Romênia.
Os getas
localizados entre dácios e trácios
Os getas ou getae haviam ocupado o
“hinterland” das colônias gregas da
costa do Mar Negro, permitindo-lhes contato com os gregos desde tempos muito antigos. Estrabão, em sua Geografia, Livro VII 3,12, (3) refere à divisão entre getas e os dácios, definindo os getas
como os que se encontravam próximos ao Ponto, a leste, e os dácios na direção oposta, próximos à
Germânia e às nascentes do rio Istro. Na opinião de Estrabão o nome
original dos dácios era daos ou daoi. Temos ainda notícias históricas de que os dácios no começo da era
cristâ teriam até mesmo derrotado o antigo povo boii, cuja “stirpe”
- os bohemi - encontraremos mais
tarde em convivência com os agilofings,
já na era cristã (4).
O território da atual Romênia fora,
portanto, habitado na antiguidade pelos dácios
que falavam uma língua indo-européia, língua dácia. Depois da conquista
romana, entretanto, a língua dácia teria
sido influenciada pelo latim. A Dácia se transformara numa província do
Império, e o “latim vulgar” se converteu na língua usada pela administração e
pelo comércio.
A palavra “aegidius” em latim seria de
origem muito antiga – minoana, grega ou etrusca – a flor lírio, significado
escolha e pureza. Na etmologia alemã antiga, entretanto, Agilulf é um nome
próprio, originado do adjetivo ágil, rápido (5).
(Minoan fresco from Thera – Santorini - c.
1600 B.C.)
Jovem com Lírio - Afresco minoano de
Thera (Santorini) c.1600 A.C.
Acima imagem
de uma jovem com lírio - afresco minoano de Akrotiri, Santorini (Thera),
Arquipálago das Cyclades, Grécia (6).
O lírio
- flor simbólica sempre apreciada na antiguidade.
“Sala
do Trono” no Palácio de Knossos, 1.350 AC., Crete/Grécia. Lírios também nos afrescos.
O
arqueólogo Mircea Babeş professor
emérito da Romanian Academy, Institute of Archaeology de Bucharest defende que
teria havido uma "verdadeira unidade etnocultural" entre os getas e os dácios na atiguidade; enquanto o historiador e arqueólogo
contemporâneo Alexandru Vulpe,
falecido em 2016, também membro da
Academia Romena e diretor do Instituto Vasile Pârvan de Arqueologia, constata
uma "notável uniformidade" na cultura geto-dácia (7).
CONCLUSÃO
A dinastia dos agilofings é tida tradicionalmente como desenvolvida na Europa no
século V d.C. a partir de seu capostipide Agiulf I (470- 512) (8).
Entretanto, neste atual ensaio sugerimos que
os agilofing tenham tido origem bem mais
antiga, goda e síria – pois godos usaram freqüentemente o prenome Agilof, Agiluf. Assim sendo, teria a família origem provavelmente ainda bem
mais antiga.
Agiluf na etmologia alemã como nome
próprio originado do adjetivo ágil, rápido. Suas variantes
“Agilolf", "Egilulf", "Egilolf" – como abreviação
"Agilo" ou "Egilo". Em latim - Aegidius, em português Egídio,
italiano Giglio, em francês Gilles,
em catalão Gil.
No latim a palavra aegidius usada pela dinastia dos AEgidius/Siagrii de que fez parte o célebre general Aegidius (nascido
cerca 390, falecido cerca 465) teria origem
grega (“aigýllion”) ou etrusca (igilium) - nome da flor lírio significa pureza
e escolha. Os membros desta família Aegidius
muito antiga ,certamente nos Aegyssus
(gaeta e dácios) antes mesmo da era cristã. Casados com senhoras sírias de prenome “Siagra” já no século sec.
III d.C. penetravam em cortes reais romanas.
Pelo acima afirmado na “Introdução” e no “Desenvolvimento”
líderes gedae e “aegyssus” teriam tido certamente convivência
muito estreita com os antigos dácios
- e também mais tarde com os “agilofs”
godos.
Numa vila chamada Agighiol, no condado de Tulcea (na Romênia), foi encontrado
um belíssimo elmo geto-dácio do sec.
V a. C., denominado “Elmo de Agighiol”.
Ressaltando que um dácio chamado Carpyus Aegyssus (Cárpio Egisso), segundo
Ovídeo teria até mesmo fundado a cidade de Egisso, na Tucea, no século VIII antes da era cristã.
Assim
sendo, ao contrário das afirmações correntes sugerimos que a dinastia dos agilofing da Idade Media européia seria
muito mais antiga do que a dinastia franca
merovíngia, surgida apenas no século IV d.C.
Notas
(1) Membros
da dinastia wido haviam descido no
século VIII d.C. com o imperador franco Carlos Magno para dominar os lombardos
na península italiana. Pelo nosso interesse em conhecer a ascendência no reino
franco da família Cavalcanti surgida em 1045 d.C. na Toscana, realizamos vários
trabalhos nos quais comprovamos esta ascendência predominantemente franca, e também
ressaltamos ligações dessa antiga dinastia agilofings
aos wido - trabalhos publicados em
nosso blog http://rosasampaiotorres.blogspot.com/
, em especial o artigo “As mais antigas origens da
dinastia wido e da família
Cavalcanti”, publicado na revista portuguesa Athena no mês de maio de 2019.
(2) Conclusões de nossos vários trabalhos, detalhados
e com todas as fontes: “Os Agilofings”, “O General AEgidius”, ”Os Reis Suevos e
a dinastia Agilofing”, até agora inéditos, mas já abertos para pesquisas.
(3) Estrabão (63 a.C. ou 64 a.C. — c. 24) historiador, geógrafo e filósofo
grego. Foi o autor da obra Geografia - 17 livros contendo a
história e descrições de povos e locais de todo o mundo que lhe era conhecido à
época.
(4)
Os dácios ou getas - como
eram conhecidos pelos antigos gregos foram um ramo dos trácios que
viviam a norte dos Bálcãs. Neste caso os dácios
(ou getas) seriam tribos trácias setentrionais.
Por volta do século V antes de Cristo
os trácios foram dominados pelos odrysios, a maior e mais poderosa tribo
do Reino da Trácia - região política maior na época dos Bálcãs orientais. O
rei da Trácia, Teres I, estabeleceu o Reino Odrísio em uma boa parte da Trácia. O reino Odrísio fundado pelo rei Teres
I aproveitava o colapso dos persa na
Europa pela invasão fracassada da Grécia em 480-79. Teres I, filho de Odryses
(ou Odriseus?) (480 /450–430 a. C.) Pesquisar sobre o reino Odrísio. No nosso
trabalho ”Os Reis Suevos e a dinastia Agilofing” ver a nota 5.
Os
dácios são
mencionados no reinado de Augusto, que os compeliu a reconhecer a
supremacia romana. O reino dácio sobreviveu de 168 a.C. até a conquista romana, em 106 d.C. A capital da Dácia, Sarmizegetusa, localizada na
Romênia.
Entretanto,
sob a regência de Burebista (Berebista)
- rei trácio de 82/61 a.C. a 45/44 a.C. (contemporâneo de Júlio César) - a partir de 61 a.C. os
limites do reino dácio foram estendidos. O povo bóio (ou boios, ou boii) teria sido também por eles conquistado, e
mesmo as cidades gregas de Ólbia e Apolônia no Mar Negro (Pontus
Euxinus). A partir de 55 a.C. as
cidades gregas na costa oeste do Mar Negro foram tomadas, uma depois da outra.
Essas campanhas inevitavelmente culminaram em conflito com Roma em 48 a.C. Para aprofundamento, consultar
perfil de Buerbista na Wikipédia.
Os povos boii
pela sua “stirp” (estirpre) bohemi tiveram
mais tarde importante atuação histórica atuando com os da dinastia agilofing, tanto na Hispania, no Reino
Suevo, quanto na formação dos duques bávaros agilofings da região de Regenburgo. Os boi e sua “stirp” bohemi
muito antiga serão referidos e objeto de nosso trabalho “Notas sobre os Bohemi”
e ”Os Reis Suevos e a dinastia Agilofing”, próximos no blog.
Também os gépidas por volta de 260 d.C. quando são notados pela
primeira vez teriam participado da invasão da Dácia com os godos, em cujo espaço se estabeleceram até o sec. VIII d.C. Os gépidas seriam uma continuação dos
povos “getae” ou getas, como refere
Jordanes. Eles da mesma origem goda ou gauta referida por Jordanes.
Ver mais indicações texto abaixo.
(5) Na costa da Itália, a ilha de Giglio teria sido
habitada por anacoretas puros no início da era Cristã. A palavra “Giglio” significando "lírio"
na língua italiana. Esta ilha de Giglio na costa da Toscana foi bastião
militar da civilização etrusca - ilha
de Igilium - tendo depois caído sob o domínio de Roma, passando a ser
referida como Aegilium Insula ou Igillia Insula. Em transliteração para
o latim, a palavra grega “aigýllion”
nomeia também um pequeno animal que vive na própria ilha, uma pequena cabra. O
nome da ilha, para alguns, significaria simplesmente "ilha da Cabra",
mas não levadas em consideração as opiniões que ligam o nome da ilha ao
“lírio”, símbolo utilizado na heráldica da República de Florença, também logo usado
pela família Malavolti no sec. IX em seu brasão. Os Malavolti casados com os da
família Giglio, mais antiga na Toscana. Sabendo também que a ilha serviu
de refúgio a monges, anacoretas, homens puros que lá se instalaram em busca de
isolamento na Alta Idade Media.
Sobre o simbolismo do lírio, consultar nosso
artigo ”Requintes dos Antigos Cavalcanti”, editado em nosso blog e que refere o
lírio como símbolo de pureza, ligado também aos requintes da família Cavalcanti
(quadros, retábulos, brasões, etc.).
(6)
A ilha grega de Santorini teria sido
também habitada pela tribo trácia
chamada pelagianos ou pélagos,
responsáveis pela instalação da cultura Minoana/Micênica antes da invasão dos povos
danaens (ou Danoi?) - gregos da
África (o
nome original dos dácios era daos ou daoi),
que auxiliados por um cataclismo natural foram depois responsáveis pelo fim da
cultura Minóica/Micênica no território da Grécia moderna. Como observamos
acima, entretanto, uma continuação desta cultura minóica está presente no “Vale
dos Reis Trácios” (Bulgária, Stara Zagora (província) Kazanlak), nos modernos
sepultamentos búlgaros-mogila, em máscaras funerárias douradas, objetos,
escritos, etc. Danaens é termo genérico pelo qual Homero às vezes designa
os gregos descendentes das Danaides, e mais especificamente os descendentes da
personagem mitológica Hipermnestra, filha de Danaos. Na Odisséia (17 175-177) Homero localiza
os pelasgos em Creta, com dois povos
aparentemente indígenas (autóctones?) e dois imigrantes (os aqueus e os
dóricos), mas não descreve os pelasgos.
Consultar
mais sobre Argos, uma das mais antigas cidades (1800 ou 1080 a.C.) e sobre
a mitologia da heroína guerreira, Hipermnestra que era uma das
filhas do rei Danaó, mitológico fundador da cidade de Argos na
península do Peloponeso. Pela enciclopédia Wikipédia “Dánao
(português europeu) ou Dânao (português brasileiro), também conhecido como
Dânaos ou Danaus (em grego: Δαναός, transl. Danaós) foi, na mitologia grega
filho de Belo, um mítico rei do Egito, descendente de Io, que fora sacerdotisa
de Hera em Argos, cidade da Grécia. Dánao era pai de cinqüenta filhas,
conhecidas como as Danaides.
(7) Ver discussão
aprofundada sobre o assunto no item “Getae” na Wikepédia.
(8) Agiulf I tido como capostipide dos agilofing na Europa, por nós identificado em lista segura da abadia de Mettlach,
lista publicada na mídia eletrônica, nascido na Suábia ou Turquia em 470,
falecido em 512 d.C na Bavária.
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